NEUA nos EUA: again

Crónicas espeleológicas,

Depois da última incursão do NEUA a um dos carsos norte-americanos em 2009, dois espeleólogos do NEUA deslocaram-se aos Estados Unidos ao longo de 2011 e aproveitaram para explorar algumas grutas.

Na costa leste dos Estados Unidos da América, uma importante zona cársica aparece ao longo da cordilheira dos Apalaches que separam a costa oriental dos Grandes Lagos, das pradarias do centro-oeste.

Rio Jackson, Virgínia, USA

Estendido pelos estados de Virginia e Virginia Ocidental, encontra-se um carso bem distinto daquele que estamos habituados a ver em território luso, formado maioritariamente por calcários Ordovícicos.

A antiguidade da rocha faz com que o modelado cársico passe desapercebido a um primeiro golpe de vista.

Paisagem no sul do estado de Virgínia, USA


No estado contíguo, o Kentucky, está a maior gruta do mundo, um sistema com múltiplas entradas, com quase 600 kilómetros de longitude horizontal, chamado Mammoth Cave e que está incluído num grande parque natural com o mesmo nome.

Saída de uma travessia espeleológica


Ao contrário do que ocorre na maioria dos países europeus, nos EUA o subsolo é propriedade do dono do terreno, o que implica que as grutas tenham efectivamente um proprietário. Virgínia Ocidental é um estado conhecido por ser o paraíso de espeleólogos reformados, que passam o resto dos seus dias a fazer espeleo, depois de comprarem uma gruta ou duas.

Sul de Virgínia

Está claro que num território no qual todos ostentam as suas armas e as grutas são privadas, todo o processo de visitação de cavidades em território alheio está sujeito a um cuidado mais aprimorado, do que o vulgar "galgar a vedação".


Entrada de Borehole cave

A vida selvagem é incrível, por todos os lados se observam grandes mamíferos em comunhão com uma paisagem florestal deslumbrante. Outro detalhe interessante é a presença assídua de ursos nas florestas dos Apalaches, sendo que encontrar um urso (a sério) a caminho das grutas pode não ser a melhor experiência para quem está habituado a ver coelhos aos saltinhos no meio do lápiaz.

Galeria activa em Borehole cave

A Espeleologia está bem organizada, qualquer espeleólogo pode ser sócio da National Speleological Society, em nome individual ou fazer parte de um grupo que seja membro, os chamados "Grotto," à parte de outras categorias mais ou menos honoríficas atribuídas pela NSS, a maior associação mundial de Espeleologia.

Todos os espeleólogos ostentam orgulhosamente o símbolo da NSS nos seus veículos e alguns até nas suas casas ou caixas do correio, para que se alguma dúvida houver depois de ler matrículas do estilo "Karst", "Cave", "Caver", Capitan Karst" entre outros, todas as dúvidas se diluam ao ver como refletem os autocolantes amarelos com morcegos.

Desengane-se quem pensa que o fanatismo espeleológico se fica pelo o uso dos autocolantes e outros íconos espeleológicos, os norte americanos são fanáticos (e muito bem) pela protecção do carso. A nível estatal imperam políticas de protecção das grutas e do carso, como património insubstituível que declaram "bem de interesse nacional".

Grutas protegidas pela lei de Virgínia Ocidental, USA

É fascinante ver o interesse que os espeleólogos norte americanos têm pelos animais cavernícolas e como cooperam em trabalhos científicos, sensos de morcegos, medições de caudais, traçagens, etc.

Salamandra cavernícola, Eurycea lucifuga

Actualmente, alguns dos morcegos cavernícolas norte americanos enfrentam um decréscimo de mais de 90% da sua população, devido a um fungo de coloração branca que prolifera ao redor do nariz dos morcegos em hibernação. Denominado Síndroma do Nariz Branco, o fungo aproveita-se do estado letárgico do morcego hibernado para se alimentar dele, esgotando-lhe as reservas energéticas antes de que este se desperte da hibernação.

É dificil ter uma ideia concreta sobre o brutal impacto deste fungo nas comunidades de morcegos cavernícolas até alguém nos dizer que todos os morcegos que vimos irão morrer antes da próxima Primavera.

Morcego cavernícola (Myotis lucyfugos), com síndroma do nariz branco

Descobertas científicas recentes, sugerem que o fungo foi levado por um espeleólogo europeu e que os morcegos europeus estão imunes ao fungo. Poucos são os morcegos cavernícolas norte-americanos imunes ao fungo, mas a selecção natural fará com que daqui a muitos anos esses sejam a maioria, se entretanto conseguirem estabilizar as suas populações e não se extinguirem.

Os espeleólogos seguem (mesmo) um rigoroso plano de descontaminação de material, após cada saída, com vista a impedir a proliferação do fungo para outros estados.

Grilos das cavernas povoam o tecto de Organ cave, Virginia Ocidental

Várias espécies cavernícolas são protegidas e estão listadas como espécies em perigo de extinção, sendo terminantemente proibido remover espécimes sem autorização estatal.

Diferenças culturais à parte, nada parece ser muito diferente no que toca a explorar grutas em terras do tio Sam.

É certo que gritam "rope off" em vez de "livre", é certo que a maioria usa o 'rack' e não sabem o que é uma mini, mas ainda assim continuo a achar que os espeleólogos são todos iguais, ora vejam a foto que se segue e que dispensa legenda.





Mais informação:

Virginia Karst

Virginia Natural Heritage Karst Program Cave and Karst Protection

National Speleological Society

Caving Protocols in Response to White-Nose Syndrome in Virginia

Mayacom 2012


Fotos: Sofia Reboleira e Dan Fong